A nova guerra no Afeganistão
 

Relações Internacionais
por Paulo Fagundes Vizentini

Como anunciado e esperado, os EUA e a Inglaterra lançaram um ataque aéreo contra o Afeganistão. Trata-se de uma iniciativa que comporta riscos, tal como adverti no artigo da semana passada. A atual fase da guerra tem objetivos mais de propaganda: dar uma resposta aos anseios de vingança de uma parte da opinião pública americana e demonstrar e reafirmar o poderio do país. Mas trata-se de um conflito radicalmente diferente da Guerra do Iraque e da Iugoslávia. Estes eram países modernos, com regimes laicos (e com uma visão "racional") e dotados de uma infra-estrutura urbano-industrial passível de ser atacada

Foto: Família de afegãos espera condução para deixar Cabul, após os ataques dos EUA. (8/outubro/2001) por bombardeios.

Já o Afeganistão não. O país não tem mais infra-estrutura, e o que foi atingido tem pouco valor. A luta será em terra, contra milícias dispersas e dotadas de uma visão "tribal" do mundo e da estratégia. Trata-se, portanto, muito mais de demonstrar a determinação americana e de estimular a oposição afegã a avançar. Os preparativos diplomáticos foram muito apressados e, seguramente, seus resultados não serão sólidos, como o tempo virá a demonstrar. Além disso, a estratégia de declarar que a guerra não é contra o povo afegão, nem contra o mundo árabe-muçulmano, pouca eficácia terá para as populações destes países. Da mesmo forma, lançar bombas e mísseis, e depois pacotes com mantimentos, é algo que raia a ingenuidade política.

Membros das forças norte-americanas e britânicas participam do ataque contra o regime talibã no Afeganistão. (8/outubro/2001)

Trata-se de uma guerra do criador contra a criatura, uma vez que os EUA, o Paquistão e a Arábia Saudita colocaram o regime Talibã no poder, estimularam e armaram o fundamentalismo contra os soviéticos, e deram projeção a figuras grotescas como Bin Laden (que agora se volta contra eles). Uma situação no mínimo embaraçosa. Por outro lado, a guerra expõe países como o Paquistão, cuja situação interna virá a definir o cenário futuro da região. O que devemos nos perguntar é qual será a próxima etapa, depois dos bombardeios. Como estabilizar o país? Quando uma guerra contra o terrorismo será ganha e quando se encerra? São perguntas sem respostas.

A nova guerra é um conflito Norte-Sul, e não um novo enfrentamento Leste-Oeste (Oriente versus Ocidente). Lamentavelmente, é um conflito entre o que de pior há nos países em desenvolvimento com o menos preparado governo que os EUA tiveram nas últimas décadas. Este não está avaliando corretamente os custos e as conseqüências da nova aventura militar.

Volto a insistir: os Talibãs são qualitativamente diferentes de Saddam Hussein e Milosevic, personagens grandemente previsíveis. Trata-se de um inimigo difuso, orientado por outra lógica. Finalmente, iniciar um conflito numa região tão sensível do ponto de vista estratégico necessitaria de preparativos mais sérios. Considero válidas as advertências feitas anteriormente: há limites sérios para esta guerra promovida pelos EUA. Eliminar Bin Laden e sua organização, e derrubar os Talibãs, não significará o fim desta guerra. (10 / 2001)

(*)

Paulo Fagundes Vizentini é Professor de Relações Internacionais e Diretor do Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados da UFRGS. Pesquisador Associado do NUPRI/USP.

Outubro de 2001

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