Marcos históricos da década de 90

Que marcos históricos melhor representam a década de 90?

Até 1990, a política internacional era regida por uma dinâmica que punha em confronto os blocos Oriental e Ocidental. Essa confrontação Leste-Oeste era centrada em duas principais ideologias, que entendiam de diferentes formas a vida, a economia e o papel do indivíduo na sociedade. Após a queda do muro de Berlim, o mundo se deparou com conflitos que estavam eclipsados pela Guerra Fria. Problemas étnicos, religiosos, separatistas e nacionalistas renasceram com força na África, no mundo islâmico e também na Europa. A América Latina continuou sua difícil luta pela construção e afirmação da identidade.
Torre de comunicações de
Collserola, Barcelona

Por outro lado, a globalização avança, ultrapassando as antigas fronteiras territoriais. A revolução tecnológica, em especial na informática e nas telecomunicações, continua causando mudanças nas formas de trabalhar e de se relacionar.


C
1. A Nova Ordem e a globalização da economia
No início da década de 90, o fim do confronto político-ideológico entre capitalismo e socialismo criou um cenário mundial com novas forças desestabilizadoras, substituindo a bipolarização pela multipolarização. Crises econômicas, nacionais, separatistas e étnico-culturais em todos os continentes confirmaram que o século XX será encerrado dentro de um contexto tão tenso quanto começou. O jogo de forças mudou, pendendo das questões político-ideológicas e militares da Guerra Fria para as econômico-tecnológicas da Nova Ordem. Isso demostra que, mais do que uma nova distribuição de forças, a última década do século XX alterou a própria natureza do poder.

1a. Novas relações
A nova situação exigiu que os Estados buscassem outras formas de relações, norteadas por novas regras dentro da esfera mundial, por associações com as grandes potências (via áreas de influência) ou pela formação de blocos econômicos. O panorama de mudanças se completou com a tendência cada vez maior da internacionalização da economia e do capital, integrando mercados mundiais dentro de um contínuo processo de globalização econômica. A globalização apresenta a tendência à liberalização da economia como um de seus elementos, exigindo que os Estados diminuam progressivamente as barreiras alfandegárias e permitam uma maior entrada de fluxos internacionais de capitais, serviços e bens. Homogeniza-se também, progressivamente, a cultura e o comportamento.

2. A formação de blocos econômicos
A dinâmica multipolar gerou associações de países de um mesmo espaço geográfico, com relações privilegiadas político-econômicas entre si, buscando uma ação conjunta dentro das novas relações capitalistas. Os principais exemplos são a União Européia (EU), o North American Free Trade Agreement (Acordo Norte-Americano de Livre Comércio – Nafta), a Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (Apec) e o Mercado Comum do Sul (Mercosul).

2a. União Européia
A União Européia, primeiro e melhor estruturado dos blocos, tem sua origem na Comunidade Econômica Européia (CEE), fundada em 1957. Mas foi o Tratado de Maastricht (1991), em vigor desde 1993, que garantiu sua formalização. Os países membros são: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Portugal, Reino Unido e Suécia. A UE possui ainda mais dois tratados, o de União Política e o de União Econômica e Monetária, tendo como destaque a adoção de uma moeda única, o Euro. O lançamento do Euro ocorreu em 1º de janeiro de 1999, sendo utilizado, inicialmente, em transações bancárias. Sua circulação formal só ocorrerá em 2002, quando substituirá as antigas moedas nacionais.

2b. Nafta
O Nafta, bloco da América do Norte, entrou em vigor em janeiro de 1994, com o prazo de quinze anos para a completa eliminação de todas as barreiras alfandegárias de seus países membros: Estados Unidos, Canadá e México.

2c. Mercosul
Criado em 1991, o Mercado Comum do Sul começou a vigorar em 1º de janeiro de 1995, estabelecendo uma zona de livre comércio com eliminação progressiva das barreiras alfandegárias entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. A maior parte dos produtos passou a ser negociada sem tarifas de importação, mantendo-se algumas limitações alfandegárias que devem ser gradualmente extintas. Visando aumentar o comércio intra-regional e ampliar o mercado comum, o Mercosul vem ganhando novos parceiros, como Chile e Bolívia. Esses dois países são considerados membros associados, pois participaram da zona de livre comércio, mas não da integração aduaneira.

2d. Apec
A Apec é o bloco econômico asiático e tem como objetivo promover a abertura de mercados entre os países associados e Hong Kong. A Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico foi oficializada em 1993, tendo o ano de 2002 como data limite para estabelecer a livre troca de mercadorias entre seus membros. É formada por Austrália, Brunei, Canadá, Indonésia, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Filipinas, Cingapura, Coréia do Sul, Tailândia, Estados Unidos, China, Hong Kong, Taiwan, México, Papua Nova Guiné, Chile, Peru, Federação Russa e Vietnã.

3. A revolução das comunicações
As novas tecnologias da informação foram o destaque da década de 90. Em qualquer ponto da cena internacional, os acontecimentos são transmitidos de imediato pela televisão. Catástrofes, guerras, eventos musicais ou esportivos são vistos simultaneamente por centenas de milhões de pessoas. Os profissionais da área de finanças obtêm informações diretas das cotações das principais bolsas de valores do mundo. Os cientistas, médicos e educadores podem acessar bancos de dados das maiores universidades do mundo por meio da internet. O mundo se transformou em um espaço mais inter-relacionado. Agora, o homem viaja por estradas virtuais; e-mails ocupam cada vez mais o lugar de cartas e telefonemas; a rede mundial de computadores liga, em minutos, lugares diferentes e permite grande rapidez no acesso à informação.

4. O fundamentalismo islâmico
Entende-se por fundamentalismo islâmico uma interpretação particular e literal da sharia (a lei do Corão), aplicada a fins políticos. Em oposição às idéias leigas, modernas e ocidentais, essa interpretação afirma que, a fim de formar um Estado islâmico puro, os valores da tradição e religião islâmica devem desempenhar um papel central na vida econômica, social e política. Vários movimentos fundamentalistas iniciados na década de 70 procuraram e ainda procuram lutar para obter e manter o controle do Estado nos países com maioria da população de religião muçulmana e ali aplicar seus princípios. Em alguns casos, essa luta resultou em revoltas populares, como no Irã em 1979 e na Argélia, Tunísia, Egito, Afeganistão, Daguestão e Turquia nos anos 90.

4a. Argélia
Na ex-colônia francesa, em meados da década de 90, o partido islâmico foi impedido de assumir o poder após vencer as eleições devido ao golpe de Estado desfechado pelos militares. O fundamentalismo provocou uma violenta guerra civil. Os choques entre forças oficiais e integrantes da Frente Islâmica de Salvação e do rival Grupo Islâmico Armado já causaram mais de 60 mil mortes, com reflexos em Paris, onde ocorreram atentados.

4b. Cáucaso
Na Ásia, o fundamentalismo islâmico vem influenciando muitos conflitos religiosos e étnicos. Em 1999, no Cáucaso, russos atacaram a Chechênia sob a alegação de destruir bases guerrilheiras dos separatistas muçulmanos do Daguestão, acusados de atentados a bombas em Moscou. Para a Federação Russa o objetivo é evitar a qualquer preço o avanço do nacionalismo separatista, reprimindo violentamente todas as ações. A "nova" Guerra da Chechênia de 1999 faria parte de uma estratégia política, visando as eleições parlamentares e presidenciais do final de 1999 e 2000, respectivamente. Junto aos interesses políticos estão os econômicos – a ambição russa de controlar as fontes de abastecimento de petróleo e de gás iranianos e da bacia do mar Cáspio.

4c. Líbano
Durante a Guerra Fria, devido à longa guerra civil, o Líbano, ex-colônia francesa, viveu um quadro de tensão permanente. A disputa pelo poder entre a minoria cristã (maronita, armênia católica, ortodoxa e protestante), que controla a economia e possui a hegemonia política, e a maioria muçulmana (xiita e sunita) manifestou-se logo após a saída dos franceses em 1946. O conflito se agravou nos anos 70, quando os palestinos, expulsos da Jordânia, decidiram se fixar no sul do país. A OLP (Organização pela Libertação da Palestina) tornou-se importante aliado dos muçulmanos libaneses, enquanto os cristãos passaram a receber o apoio de Israel. A guerra aberta começou em 1975, preocupando a Síria que, no ano seguinte, decidiu intervir na região norte do país. A situação piorou em 1982 quando tropas israelenses ocuparam o sul do Líbano como represália aos atentados terroristas contra o governo de Israel. A meta dos israelenses era expulsar os guerrilheiros da OLP e combater a milícia islâmica do Hezbollah, formada por dissidentes xiitas ligados ao Irã. Em 1999, o fortalecimento da via diplomática para resolver as tensões no Oriente Médio possibilitou a aproximação entre Israel e Síria. Nessas negociações, um dos principais pontos de discussão foi a retirada das tropas israelenses do sul do Líbano até julho de 2000 (fato antecipado para 24 de maio).

4d. Afeganistão
Devastado pela guerra contra a União Soviética, que ocupou a região entre 1979 e 1989, o Afeganistão assistiu à ascensão da milícia Taleban ("estudante", em persa), grupo fundamentalista financiado pelo Paquistão que, em 1996, assumiu o controle de 70% do país, porcentagem que logo subiu para 90%. Orientados pelo rigor da sharia, os talebans acreditam ser possível estabelecer "o paraíso de Alá na Terra", impondo severas restrições ao dia-a-dia e punições à população, em particular às mulheres. O governo do Taleban sofre sanções econômicas determinadas pela ONU desde novembro de 1999 e é reconhecido somente pela Arábia Saudita, pelos Emirados Árabes Unidos e pelo Paquistão. O contexto limita as possibilidades de sucesso do acordo de paz firmado em 1999 entre o Taleban e as facções opositoras, ficando cada vez mais distante a chance de pacificar o país, em guerra civil há duas décadas.

5 O auge dos nacionalismos
Em muitos países do mundo, o fim da Guerra Fria provocou uma verdadeira crise de identidade coletiva. Diante de tendências econômicas que visam integrar um número cada vez maior de países em grandes mercados mundiais, surge a necessidade de uma recuperação do sentido coletivo de grupo.

5a. Bélgica e Quebec francês
Enquanto Suécia, Finlândia e Áustria entraram na União Européia, em 1992, a Bélgica instituiu um Estado federal que delegou ao governo central os assuntos de defesa, previdência social, política monetária e relações exteriores. Três federações tiveram a autonomia garantida – Valônia, Flandres e Bruxelas. Paralelamente, o Quebec francês afirmou sua identidade num simpósio, mas a proposta de autonomia não foi aprovada em plebiscito.

5b. A questão da Irlanda
A católica Irlanda foi anexada ao Reino Unido no século XIX. O nascimento do Estado Livre da Irlanda, na década de 20, aconteceu após violentos conflitos. Em 1949, surgiu a católica República da Irlanda (Eire). Na década de 60, a minoria católica do Ulster (Irlanda do Norte) passou a reivindicar maiores direitos e a reunificação com o Eire. Alternando luta armada e pacífica, o IRA – o Exército Republicano Irlandês – partiu para o terrorismo, sob forte repressão britânica. O processo de paz começou na década de 90, com o estabelecimento do Acordo da Sexta-Feira Santa (1998). Católicos e protestantes, rivais históricos, aceitaram o desafio de governarem juntos a Irlanda do Norte, aguardando o desarmamento do IRA e de grupos paramilitares protestantes.


Para lembrar:
O nacionalismo democrático, bem representado nos casos irlandês e canadense, não é o único: o velho nacionalismo intolerante também ressurge em algumas zonas da Europa, como o basco na Espanha e o sérvio na ex-Iugoslávia.


5c. O País Basco
Os bascos sempre defenderam sua independência, resistindo à incorporação pela Espanha e França. A ditadura de Francisco Franco (1939-1975) reprimiu as manifestações autônomas regionais e a cultura basca. Surgiu então a ETA que, na década de 60, passou à luta armada. Com a redemocratização espanhola, foi concedida autonomia política e cultural às províncias bascas, mas, embora a maioria da população deseje uma solução pacífica, a facção extremista da ETA intensificou o terrorismo. Em 1998, a ETA declarou um cessar-fogo aceito pelo governo central, devido ao seu isolamento e às pressões do impacto do avanço da via político-diplomática na Irlanda. Apesar disso, os conflitos retornaram no início de 1999.
6. As etnias da Iugoslávia
A Iugoslávia era integrada por várias etnias distintas. Os grupos majoritários eram sérvios, croatas, macedônios, eslovenos e montenegrinos. Quanto à religião, aproximadamente 41% pertenciam à Igreja ortodoxa, 32% eram católicos e 12% muçulmanos. Passaram a existir cinco Estados bem diferenciados: Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina, Macedônia e Sérvia-Montenegro. A estas se acrescentam os territórios autônomos de Kosovo (albaneses) e Vojvodina (húngaros).
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6a. Guerras nos Bálcãs, um histórico "barril de pólvora"
No final da Segunda Guerra Mundialm, consolidou-se, nos Bálcãs, a Iugoslávia, federação que agrupava sob um regime comunista peculiar povos de diversas nacionalidades, com diferentes línguas, culturas e religiões. Após a morte do marechal Tito, que governou o país desde 1945, o sistema político comunista entrou em crise e a federação iugoslava se desagregou. O país ficou limitado à Sérvia e Montenegro. No final da década de 80, a tentativa dos sérvios de impor sua hegemonia ao país deflagrou o rompimento. A Macedônia, a Eslovênia e a Croácia proclamaram a independência. Em 199,1 o conflito estourou com enorme violência e crueldade na Bósnia-Herzegovina. Proclamou-se um modelo de convivência multirracial, frente ao critério de "limpeza étnica" dos sérvios e aceitaram-se as condições da ONU para o fim do conflito armado. Em novembro de 1995, foi assinado em Dayton (Estados Unidos) um acordo de paz que manteria a Bósnia como um único Estado, formado por duas entidades: uma sérvia e outra croato-muçulmana. Apesar disso, novos conflitos se seguiram.

6b. A Guerra de Kosovo
Deportações e "limpezas étnicas" envolvendo tensões entre sérvios – cristãos ortodoxos de origem eslava – e muçulmanos – bósnios (eslavos) e kosovares (origem albanesa) – são antigos nos Bálcãs. A suspensão, em 1989, da autonomia de Kosovo (província sérvia de maioria albanesa à qual o marechal Tito dera certa liberdade) gerou um movimento separatista, logo transformado em luta armada com a formação do Exército de Libertação de Kosovo (ELK), apoiado pela Albânia. Recusando-se a perder mais territórios, o líder sérvio Milosevic intensificou a repressão à província em 1998, com a justificativa de proteger os sérvios. Uma nova "purificação étnica" aconteceu. Fracassadas as negociações de paz em 1999, a OTAN realizou bombardeios e ocupou Kosovo. Uma missão de paz da ONU vem organizando a administração, repatriando refugiados, desarmando o ELK e protegendo a minoria sérvia.

7. A CEI e o Leste europeu
Em 1991, o golpe frustrado de membros da burocracia conservadora e a independência das Repúblicas Bálticas (Estônia, Lituânia e Letônia) enfraqueceram ainda mais o governo de Mikhail Gorbatchev na União Soviética. Bóris Yeltsin aproveitou-se da situação e, com outras lideranças, assinou o Acordo de Minsk, que marcava o início da Comunidade dos Estados Independentes (CEI). Instabilidade político-econômica e tensões étnico-separatistas foram constantes durante toda a década de 90. Na Chechênia, a guerra com a Rússia (1994-1996) não garantiu a independência desejada pelos chechenos, mas, após
Exército russo sufoca revolta nacionalista na Chechênia

violentos confrontos armados, os russos concederam-lhes autonomia. Os conflitos no Cáucaso demonstram que o separatismo, uma das heranças do fim da União Soviética que tanto assombrou Bóris Yeltsin, continua a preocupar o governo de Vladimir Putin. Na era da globalização, a Rússia e o "novo" Leste europeu convivem, simultaneamente, com o pior do socialismo e do capitalismo: atraso, burocracia, desemprego, inflação, além da fragmentação.


8. A Questão Palestina
Negociações entre israelenses e palestinos abriram caminho para o regresso dos refugiados palestinos, o exercício do direito de autodeterminação e a criação de um Estado independente. Pelos acordos de Oslo (1993), houve o reconhecimento mútuo entre Israel (governado pelo primeiro-ministro Yitzhak Rabin) e OLP (liderada por Yasser Arafat). Também foram iniciadas negociações para a retirada de tropas israelenses, a devolução de áreas e a transferência do poder à Autoridade Nacional Palestina (ANP). Em 1994, os palestinos obtiveram autonomia limitada nos territórios de Gaza e Jericó.

8a. Limitação do processo de paz
O processo de paz ficou limitado pelas contínuas radicalizações político-religiosas, pelo assassinato de Rabin (1995) e pela vitória eleitoral, em Israel, do direitista Benjamin Netanyhu (1996). As dificuldades políticas para Netanyhu cumprir suas propostas eleitorais, a recessão econômica e o fortalecimento do caminho diplomático para as tensões no Oriente Médio colaboraram para o retorno do Partido Trabalhista ao poder israelense com a vitória de Ehud Barak em 1999. A recusa de Israel em desocupar territórios e a fundação de novas colônias, além de ataques terroristas de judeus radicais e do Hamas (guerrilha extremista palestina) criaram mais problemas no Oriente Médio, retardando a criação de um Estado Palestino. No entanto, a retomada do diálogo entre sírios e israelenses e, em 24 de maio de 2000, a retirada de Israel do sul do Líbano, encerrando 22 anos de ocupação, são passos importantes para a concretização e o avanço do
processo de paz.

Nelson Mandela, presidente da África do Sul 9. O fim do apartheid
A palavra apartheid denomina o conjunto de leis e decretos restritivos impostos, a partir de 1948, pela minoria branca da África do Sul ao restante da população. O apartheid jogou na ilegalidade o Congresso Nacional Africano (CNA) e, em 1963, encarcerou seu líder, Nelson Mandela. Em 1976, a opinião pública internacional indignou-se com a brutal repressão policial que custou a vida de 700 jovens manifestantes nas ruas de Soweto. Um ano depois, a tortura e a morte de um jovem advogado negro, Steve Biko, acelerou o isolamento da África do Sul nos tribunais internacionais. O apartheid chegou ao fim em 1990, quando o presidente Frederik de Klerk legalizou todos os partidos políticos proibidos. O CNA negociou com o governo de minoria branca o fim do apartheid e Nelson Mandela, líder da maioria negra sul-africana, foi libertado. As eleições gerais, realizadas após sua liberdade, foram vencidas pelo CNA. Em abril de 1994, Nelson Mandela assumiu a presidência da África do Sul e formou um governo multirracial. As eleições parlamentares de 1999 garantiram a manutenção do CNA no comando do país, confirmando a escolha de Thabo Mbeki, indicado por Mandela, para a presidência. Seu atual desafio é fortalecer a democracia e minimizar os graves problemas internos (diferenças sociais entre brancos e negros, Aids, oposição branca etc.).

10. A situação da África
A região conhecida como África Negra – território ao sul do Saara – está associada a massacres entre etnias, guerrilhas, tribalismo, governos opressores, atraso, miséria, epidemias e endemias. Com o fim da Guerra Fria, devido ao abandono internacional, conflitos étnico-tribais explodiram, reforçados pela marginalização social e estagnação econômica dos países recém-emancipados.

10a. As ex-colônias portuguesas
Após a independência, estouraram guerras civis nas ex-colônias portuguesas. Em Moçambique, o grupo socialista Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) assumiu o poder, enfrentando a oposição da anticomunista Resistência Nacional Moçambicana (Renamo). Os conflitos continuaram na década de 90, embora a Frelimo tivesse abandonado o marxismo. Em Angola, confrontaram-se três grupos guerrilheiros de ideologias e etnias diferentes. De um lado, o Movimento Popular pela Libertação de Angola (MPLA), de orientação socialista, apoiado por Cuba e União Soviética. De outro, a União Nacional pela Independência Total de Angola (Unita) e a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA – dissolvida no fim dos anos 70), ambas de alinhamento pró-ocidental e auxiliadas pelos Estados Unidos e pela África do Sul. Apesar de reconhecida por vários países, a vitória do MPLA nas eleições de 1992 não foi aceita pela Unita. Os choques entre etnias e seus grupos políticos já causaram 1,5 milhão de mortos e, a cada ano, cresce o número de vítimas dos campos minados pelos rivais . Embora tenham feito um acordo de paz, forças do governo (MPLA) e guerrilheiros da Unita ainda combatem pelo controle de áreas do país.


Refugiados fogem dos conflitos raciais em Ruanda

10b. Os enfrentamentos étnicos na África Central
Os embates entre hutus e tutsis, na África Central, criaram um quadro de massacres e instabilidade política em Ruanda, Burundi e República Democrática do Congo (ex-Zaire, antigo Congo Belga). O conflito em Ruanda provém de uma longa história de rivalidades tribais e étnicas. Após a Segunda Guerra Mundial, o grupo hutu se rebelou contra a monarquia tutsi e desencadeou uma guerra civil. Vitorioso, mas carente de ideologias, o governo hutu organizou o Estado baseado em critérios étnicos: os tuas se ocupariam das tarefas artesanais, os tutsis da criação de gado e os hutus da propriedade da terra. Em 1982, o general Juvenal Habyarimana abriu novos rumos, numa gestão mais democrática e com melhorias sociais. O assassinato de Habyarimana, em1994, foi o estopim para os ataques entre hutus e tutsis. A violenta guerra civil em Ruanda levou ao genocídio de tutsis por extremistas hutus. A vitória dos tutsis, no entanto, provocou o êxodo de civis e combatentes hutus para o leste do Zaire (atual República Democrática do Congo), onde ficaram em campos de refugiados. Rebeldes tutsis que queriam derrubar o governo do Zaire – controlado pelo ditador Mobutu – dominaram a região e expulsaram os refugiados hutus. Os civis voltaram a Ruanda. Os combatentes, temendo represália tutsi, foram para as florestas. Massacres e instabilidade política espalharam-se nos países vizinhos. No Zaire, após décadas de luta guerrilheira, o ditador Mobutu, no poder desde 1995, foi deposto por Kabila, em 1997. No final de 1999, tropas ruandesas e ugandenses, que entraram no país para ajudar os oposicionistas, começaram a lutar entre si pelo controle das áreas produtoras de diamantes. Em fevereiro de 2000, buscando encaminhar a paz, o Conselho de Segurança da ONU autorizou o envio de uma força militar ao país para tentar aplicar o acordo de paz firmado no ano anterior.



11. Problemas na Ásia
Tensões e conflitos também abalam a Ásia. Na China, apesar da forte repressão, o regime comunista vem enfrentando movimentos nacionalistas e religiosos no Tibete (budista), submetido desde 1950, e em Xinjiang (muçulmano). Desde 1947, a Índia, de maioria hindu, disputa com o muçulmano Paquistão o território fronteiriço da Caxemira. A tensão serve como pano de fundo para que os dois lados ampliem seu poderio bélico, trazendo novamente para o cenário mundial a ameaça de uma guerra nuclear, diante dos testes militares de Índia e Paquistão em 1998 e 1999. A vitória indiana, em 1999, não significa o fim das disputas, apenas um intervalo de uma antiga rivalidade.

11a. A República Popular da China
Na Nova Ordem mundial, a importância da China tem sido destacada por vários fatores: elevados índices de crescimento, amplo mercado consumidor, mão-de-obra abundante, proximidade dos Tigres Asiáticos e o sucesso da integração territorial. A incorporação pacífica de Hong Kong (colônia britânica), em 1997, e de Macau (possessão portuguesa), em 1999, baseia-se na teoria de Deng Xiaoping: "um só país, dois sistemas", ou seja, uma só China, em grande parte socialista, com dois enclaves capitalistas e democráticos. A China ainda oferece a mesma fórmula para Taiwan (ou República Nacionalista da China), fundada na ilha de Formosa pelos nacionalistas em 1949, após a derrota na guerra civil. Considerada "província rebelde", Taiwan ainda rejeita a reunificação, apesar da pressão militar continental e do diálogo iniciado em 2000. Para os próximos anos, a China ainda tem alguns desafios a enfrentar: contrastes entre o litoral e o interior, o êxodo rural, a concentração de renda, o desemprego, a corrupção na burocracia estatal, as dissidências e a ausência de liberdades democráticas, entre outros.

11b. O despontar do Japão
Após a Segunda Guerra, o Japão entrou para a área de influência norte-americana, exportando produtos industrializados e importando produtos agrícolas. Iniciado no final dos anos 50, o "milagre japonês" garantiu ao país a segunda colocação dentro do mundo capitalista durante a década de 80. Graças à oferta de mão-de-obra, investimentos em educação e tecnologia, poucos gastos militares e alta taxa de poupança interna, o país conseguiu superávit na balança comercial com os Estados Unidos e, nos anos 80, ultrapassou os norte-americanos na produção de automóveis, conseguindo também firmar seu comércio exterior na Ásia. Essa situação foi alterada algum tempo depois, por causa de problemas internos e pelos problemas econômico-financeiros mundiais, efeitos da globalização. O desaquecimento da economia japonesa levou muitos analistas a considerarem os anos 90 como uma "década perdida".

11c. Timor Leste
O problema no Timor Leste explodiu após a crise econômica asiática de 1997, que causou a queda do ditador Suharto. Seu sucessor, Habibie, anunciou um plebiscito para definir o destino de Timor Leste, pondo em risco a unidade do arquipélago indonésio. Após o resultado do plebiscito de agosto de 1999, a favor da independência timorense, desencadeou-se um massacre organizado por milícias armadas pró-Indonésia. A capital, Dili, foi destruída, forçando a população ao êxodo. Sob pressões, a Indonésia aceitou o envio de uma força multinacional, sob comando da Austrália. O país busca a reconstrução e o principal líder da resistência, Xanana Gusmão, tem participado no processo.

11d. A futura reunificação da Coréia
O acordo firmado em entre os líderes das duas Coréias, em junho de 2000, representou um importante avanço para a paz e a segurança no leste asiático. O acordo determina a necessidade do país funcionar como uma federação durante um período intermediário antes de sua completa reunificação.

12. A América Latina
As guerrilhas, inspiradas no socialismo e ativas na América Latina nas décadas de 60 e 70, perderam o sentido na Nova Ordem mundial. Mas suas causas persistem, em especial a miséria e a desigualdade social. Alguns países ainda registram atividades guerrilheiras, alimentando radicalismos.

12a. Os Zapatistas no México
No México, o Exército Zapatista de Libertação Nacional sublevou o pobre estado de Chiapas em 1994, exigindo "pão, saúde, educação, autonomia e paz" para os camponeses, em sua maioria indígenas. Além disso, o PRI (Partido Revolucionário Institucional), depois de sete décadas no poder, perdeu a hegemonia, pois as eleições de 2000, coordenadas por uma instituição independente do governo (Instituto Federal Eleitoral), foram marcadas por uma disputa apertada entre o candidato priista Francisco Labastida e o oposicionista Vicente Fox.

12b. O PRI
No poder desde 1929, o Partido Revolucionário Institucional deteve o controle da burocracia estatal e dos sindicatos, em meio ao nepotismo e à corrupção. Em contrapartida, realizou a reforma agrária e afastou os militares da política. Essa "ditadura perfeita" era referendada periodicamente por votações fraudadas. No final da década de 80, o PRI empreendeu reformas neoliberais que, embora modernizadoras, levaram o país à crise financeira e ao aumento da corrupção. Na histórica eleição de 2000, a derrota do PRI acaba com o seu monopólio do poder, passo decisivo para a democracia mexicana.

12c. Peru e Colômbia
No Peru, o movimento Sendero Luminoso, inspirado no maoísmo e alicerçado na guerrilha rural, é o grupo mais violento. O Movimento Revolucionário Tupac Amaru, influenciado pelo guevarismo, concentrou sua ação nas cidades, como a invasão da embaixada japonesa em 1997. O presidente Alberto Fujimori, responsável por um autogolpe em 1992, foi reeleito para um terceiro mandato em 2000, num processo eleitoral bastante polêmico. Na Colômbia, as Forças Armadas Revolucionárias (FARCs) e o Exército de Libertação Nacional têm prejudicado o fortalecimento democrático no país, sabotando eleições e realizando inúmeros seqüestros, inclusive de crianças. As FARCs, inclusive, dominam parte do território colombiano.

12d. Atuação na legalidade
Alguns grupos abandonaram os confrontos. A Frente Sandinista na Nicarágua e o colombiano M-19 tornaram-se partidos políticos para atuar na legalidade. Outros selaram acordos de paz com o governo: a Frente Farabundo Martí de El Salvador e as guerrilhas da Guatemala.

12e. A situação na América do Sul
Em 1999, na América do Sul, coalizões de partidos de esquerda chegaram ao poder democraticamente e com programas moderados. Defendendo a privatização, a economia de mercado e a integração em blocos, essas coalizações inovaram com outras prioridades: emprego, redistribuição de renda e política social. As urnas argentinas proclamaram a vitória de Fernando de la Rúa, candidato da Aliança União Cívica Radical (UCR) e Frente País Solidário, encerrando a "era Menem" (1989-1999). O modelo neoliberal, a dolarização, a neutralização dos sindicatos e dos militares afastaram Carlos Menem das bases do peronismo e do poder. De la Rúa enfrenta o desafio de reajustar a economia. No Chile, as eleições proclamaram a vitória de Ricardo Lagos, do Partido Socialista, candidato da coalizão governista Concertación, no poder desde 1990, com o fim da ditadura do general Augusto Pinochet.

Para lembrar:
Preso em Londres, em 1998, a pedido de um juiz espanhol, Augusto Pinochet está sendo acusado de violação dos direitos humanos durante sua presidência (1973-1990). O retorno ao Chile, em 2000, não garantiu ao velho general o fim das acusações, especialmente após perder a imunidade parlamentar. Julgar os crimes do ex-ditador é um dos primeiros desafios para a administração do presidente socialista Lagos.


12f. Canal do Panamá
Na passagem para o ano 2000, o canal passou a ser administrado pelo Panamá. Independente da Colômbia em 1903, o país teve de aceitar um tratado que, dentro da política do Big Stick, criava a zona do canal, sob controle perpétuo norte-americano. Nos anos 70, pressões nacionalistas panamenhas levaram a negociações para sua devolução.

12g. Cuba
Na Nova Ordem, Cuba constitui um grande enigma. O fim da União Soviética e do Comecon provocou crise na economia da ilha. Para recuperá-la, o governo admitiu a propriedade privada, empresas associadas com o capital estrangeiro, zonas francas e parques industriais, além de acabar com o monopólio estatal sobre o comércio exterior. Os investimentos estrangeiros vêm crescendo no país e o turismo destaca-se cada vez mais. Apesar disso, ainda restam algumas dúvidas. As conquistas sociais da Revolução poderão ser mantidas diante da crise generalizada? Como ficará Cuba sem Fidel Castro? Para os Estados Unidos, como encarar um país socialista em seu "quintal" e administrar o problema da grande leva de refugiados cubanos?

13. Desafios na Nova Ordem
Os valores que emergiram com a Nova Ordem se defrontam com uma onda de conservadorismo e nacionalismo, representados em especial por partidos e grupos neonazistas. Com o fim do comunismo na Europa, em 1989, tendências nacionalistas de direita reprimidas vieram à tona, espalhando ódio étnico e racial pelo continente e fora dele. A Alemanha – o mais rico, populoso e influente país da União Européia – ainda convive com as conseqüências da divisão e da reunificação: disparidades socioeconômicas e diferenças políticas, além de preconceitos e do "fantasma" do neonazismo. Jovens, principalmente, temem que seu futuro seja sacrificado por ideais liberais e se agrupam em gangues. A mais famosa é a dos skinheads: violentos e reacionários, considerados "soldados" desse movimento.

13a. A crise no conceito de nacionalidade
O neonazismo não se limita à Alemanha, aparecendo de forma marcante em outros países, como a Áustria, onde em 1999 e 2000, o Partido do Povo Austríaco (OVP), representado pela liderança do direitista Jorge Haider, tornou-se a segunda força política no país. Isso representa mais um desafio para as instituições democráticas neste final de milênio. A chegada de africanos, asiáticos e outros à Europa gerou tensões e impôs a necessidade de novos conceitos de nacionalidade e de Estado-nação. Considerados "cidadãos de segunda categoria", os habitantes das ex-colônias e seus descendentes tornaram-se alvo de ultranacionalistas. Políticas racistas e xenófobas vêm ganhando espaço em alguns países. O tratamento dispensado a argelinos na França, a turcos na Alemanha e a estrangeiros em geral nos países europeus ilustra as tensões geradas pelas novas migrações. Atentados, preconceitos e discriminações contra imigrantes acirram as tensões sociais na Europa.



Fonte: Klickeducação


 

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